A casa cheia foi a prova da relevância e do interesse pelo tema, que atraiu cerca de 550 participantes de diversas localidades do Nordeste para debater a pergunta-chave: é possível produzir mesmo em período de seca prolongada? A resposta foi positiva, mas não única: “Não existe uma panaceia, o que temos é um leque de alternativas”.
A afirmação é do pesquisador Pedro Gama, chefe geral da Embrapa Semiárido, instituição organizadora do Seminário Convivência Produtiva com a Seca: Soluções Tecnológicas e Estratégias de Ação. O evento foi realizado na sede do centro de pesquisa, localizado em Petrolina-PE, durante os dias 14 e 15 de março, e contou com a participação de produtores, associações, federações e cooperativas, organizações não governamentais, órgãos de assistência técnica, secretarias municipais de agricultura, parlamentares, além de instituições públicas federais, a exemplo da Superintendência de Desenvolvimento do Nordeste (Sudene), Instituto Nacional do Semiárido (INSA), Departamento Nacional de Obras de Combate à Seca (DNOCS) e universidades.
De acordo com Pedro Gama, o evento mostra que as alternativas para o Semiárido partem dos conhecimentos gerados pelas instituições de pesquisa, mas também da experiência da assistência técnica e das estratégias adotadas pelos próprios produtores. “Daí a ideia de trazer não apenas as informações técnico-científicas, mas também os relatos de experiências bem sucedidas no campo”, explica.
O depoimento do produtor Eduardo Emídio dos Santos, de Riachão do Jacuípe-BA, comprova que a diversidade de estratégias adotadas é que mantém ativos os sistemas produtivos. Em sua propriedade, tem criação de animais como caprinos, bovinos e peixes, cultiva fruteiras, além de ter uma área de Caatinga da qual faz diferentes usos.
Com o apoio da assistência técnica, ele adota tecnologias já testadas e validadas pela pesquisa, como a barragem subterrânea para acúmulo de água no solo, a silagem para conservar forragem durante o período seco, e os diferentes manejos da vegetação nativa para alimentação animal. Mas também cria soluções para outros problemas que enfrenta ou oportunidades que encontra, como o uso da palma como isolante térmico, evitando a evaporação da água do solo, o que favorece seus cultivos.
Assim, Eduardo mostra o diferencial da propriedade que conta com tecnologia e criatividade: “Na minha região, quem tem 500 tarefas de terra hoje compra leite em pó porque não produz nada. Nós, com 55 tarefas, fechamos o ano de 2016 com a média de 192 litros por dia, e hoje, mesmo com a seca, estamos com 186”, conta orgulhoso, ressaltando que todo o trabalho é feito por ele, a esposa e o filho.
Soluções – A programação do seminário iniciou com uma contextualização do cenário climático da seca prolongada no Semiárido – um evento que é cíclico e que vem se repetindo ao longo da história, aproximadamente a cada treze anos, como explicou o professor Mário Miranda, da Universidade Federal do Vale do São Francisco (Univasf). Assim sendo, são necessárias soluções para enfrentar não somente esta estiagem, mas também as próximas que virão.
Para garantir a criação de animais – uma das principais atividades produtivas no Nordeste brasileiro –, o pesquisador Tadeu Vinhas Voltolini, da Embrapa Semiárido, apresentou alternativas de manejo e alimentação dos animais, utilizando plantas nativas da Caatinga, como a maniçoba, resíduos agrícolas e agroindustriais, além de forrageiras cultivadas, como os capins buffel e corrente.
“Nós temos diferentes situações no Semiárido. Enquanto em uma determinada localidade temos um rebanho de caprinos se alimentando da Caatinga, em outras podemos ter bovinos se alimentando principalmente à base de palma, por exemplo. Essa diferença entre as localidades dá a entender que nós não podemos ter uma solução única e padronizada para a região semiárida. Precisamos ter soluções que vão sendo direcionadas a cada uma dessas principais situações”, destaca o pesquisador.
Outro dos temas discutidos no evento foi a gestão e o uso eficiente da água na produção agropecuária, englobando as tecnologias de captação de água da chuva, como as cisternas para diferentes usos, barragens subterrâneas, barreiro e captação in situ. Alternativas como os pulmões verdes coletivos para a criação de caprinos e ovinos, o uso de bio-água e os quintais produtivos familiares também foram apresentados por pesquisadores, complementadas pelos relatos de experiências bem sucedidas de produtores na pecuária e na permacultura.
Foram apresentadas, ainda, as potencialidades do Bioma Caatinga, por meio do extrativismo e do plantio de fruteiras nativas. A possibilidade de comercialização tanto in natura quanto para produtos processados foi confirmada pela experiência de extrativismo comunitário da Cooperativa de Agropecuária Familiar de Canudos, Uauá e Curaçá (Coopercuc), na Bahia, que há mais de uma década processa frutas como o umbu e o maracujá do mato, gerando renda complementar para as famílias.
Ações futuras – Ao final das apresentações, um trabalho em grupo, com a contribuição de todos os participantes do seminário, discutiu e apontou as estratégias de ações para garantir a produção no atual cenário de seca prolongada. Além de orientar os futuros trabalhos de pesquisa da Embrapa, o resultado das discussões será transformado em um documento, que poderá servir de subsídio para os governos e instituições públicas em suas ações voltadas para a convivência com a seca.