Um estudo conduzido pela Embrapa, em parceria com a empresa Revbio, demonstrou ser possível alterar a microbiologia da rizosfera e da parte aérea de plantas cultivadas em solos agrícolas degradados, transferindo microrganismos das plantas de uma área biologicamente mais equilibrada para outras áreas colapsadas.
A técnica visa potencializar plantas cultivadas em áreas em desequilíbrio biótico utilizando a comunidade microbiana presente em áreas de alta expressão produtiva, sem problemas fitossanitários, utilizando conceitos da conhecida engenharia do microbioma das plantas.
A tecnologia também propõe nova abordagem para o uso de comunidades de microrganismos benéficos associadas às raízes, tornando os sistemas de produção mais responsivos e equilibrados.
O pesquisador Andre May, da Embrapa Meio Ambiente, que coordenou o estudo, explica que a técnica conhecida como transplante biológico, difundida em outros segmentos da ciência, foi desenvolvida utilizando sistemas em equilíbrio biótico, presentes em áreas cultivadas de excelência, no qual os genomas vegetal e microbiano interagem em perfeição, conforme o mando ambiental. “O que fizemos foi trazer essa realidade para condições controladas de produção agrícola, manipulando o o ambiente, visando máxima interação entre os genomas, para que pudéssemos extrair desse processo complexo uma linha de produtos conceitualmente simples, já presentes na natureza em seu processo de evolução constante”, conta.
O conceito foi testado em uma ampla variedade de culturas de interesse comercial e respondeu com aumentos de produtividade em condições reais de cultivo entre 10% e 30%, inclusive com melhoria no desempenho da resistência a doenças e pragas de algumas lavouras.
Como foi a pesquisa
Os pesquisadores selecionaram lavouras de alta produtividade, sem problemas fitossanitários, para serem doadoras de solo com carga microbiana positiva. Esse solo especial foi adicionado a substratos organicamente preparados e acondicionados a “bags” para cultivo das plantas sadias, que se desenvolveram até um ponto ideal de recrutamento microbiano: fonte da comunidade microbiana, extraída e estabilizada por um processo industrial.
Os cientistas então testaram diversas fontes de comunidades microbianas totais presentes nas plantas cultivadas, contendo microrganismos endofíticos – aqueles presentes no interior das plantas, e rizosféricos – que vivem em parceria com as raízes – com frequência e diversidade diferentes.
Foram realizadas verificações na cultura da soja, em condições pré-comerciais, sendo uma dessas realizadas em São Gabriel do Oeste (MS), com e sem o uso de defensivos, conforme os tratamentos estudados. Os testes apontaram um incremento de 11% na produtividade da oleaginosa, quando comparado à testemunha não tratada, além de melhora na concentração de potássio do tecido vegetal das plantas tratadas. Isso é importante uma vez que o mineral está ligado à algumas funções cruciais à produtividade dos vegetais.
A metodologia também foi testada com o trigo, no estado de São Paulo, cultura em que se verificou expressivo aumento na produtividade da área tratada, de 18% em relação à testemunha; no milho a produtividade foi 25% maior; para o feijão o acréscimo foi de 12,95% na produção, quando comparada a planta não tratada. Já os testes com cenouras, realizados em Andradas (MG), a produtividade foi 30,3% maior.
Experimentos com batatas
Os produtos contendo a comunidade microbiana total de plantas cultivadas foi amplamente testado na cultura da batata, com as cultivares Ágata e Atlantic, inoculadas com os bioprodutos.
As duas variedades, durante a pesquisa, apresentaram respostas distintas quanto à incidência e efetividade da doença. A requeima, considerada a principal doença da batata no mundo, foi o distúrbio que mais afetou as duas variedades, sendo que a cultivar Atlantic apresentou significativa diminuição da doença, quando as plantas foram tratadas com a tecnologia.
A variedade Atlantic apresentou também um aumento nos calibres comerciais mais valorizados dos tubérculos, além de melhora em seu rendimento, com a utilização do produto. Já a cultivar Ágata apresentou acentuada redução dos defeitos nos tubérculos produzidos.
A produtividade da lavoura de batata foi de 9,4% maior em comparação à testemunha não tratada, em testes realizados no estado do Paraná, em condição climática extrema, com períodos de chuvas recorrentes.
Como funciona
O perfil bacteriano de plantas inoculadas com o ‘pool’ de microrganismos foi enriquecido com grupos bacterianos promotores do crescimento das mesmas. Esses grupos são ligados a funções específicas de proteção e nutrição, por exemplo.
O cientista explica que, por um processo inovador, os microrganismos são extraídos das plantas doadoras, que os recrutam de substratos especialmente preparados. Eles são então estabilizados em um pó solúvel em água que pode ser aplicado por duas vias: tratamento de sementes ou pulverização foliar, conforme a cultura.
Por se tratar de um produto capaz de carregar a comunidade microbiana com afinidade à célula viva original da planta cultivada, há uma alteração do microbioma da planta tratada, gerando um enriquecimento de grupos funcionais importantes. “Tratamos soja com os microrganismos da soja e cenoura com os microrganismos da cenoura, e assim por diante”, explica May.
O pesquisador ressalta haver uma linha de produção específica para cada cultura de interesse. Assim, os produtos são gerados para cada cultura e fase de interesse, pois variam, conforme a fenologia da lavoura. “Os produtos advêm da parte aérea e das raízes das plantas, com funções e formas de aplicação diferentes”, declara.
André May, pesquisador da Embrapa ainda afirmou que para a geração de bioprodutos inoculantes de alta qualidade biológica, o uso de solos com histórico produtivo elevado é vital para que o processo de transplante possa resultar em plantas mais vigorosas.
Fonte: Canal Rural